Isótopos radiogênicos aplicados ao estudo de rochas ígneas

Conceitos Básicos

Os isótopos radiogênicos têm sido utilizados de duas maneiras principais. Historicamente a primeira aplicação é voltada para a determinação de idades de rochas e minerais. Esta aplicação tem se mostrado muito importante para a definição temporal de processos geológicos como magmatismo, metamorfismo, sedimentação, metalogenético, entre outros. A segunda aplicação é mais recente e utiliza os isótopos radiogênicos para estudos petrogenéticos visando a identificação de tipos de processos geológicos e composição (assinaturas isotópicas) de fontes.

A primeira aplicação de isótopos radiogênicos recebeu a denominação genérica de geocronologia, e a aplicação mais recente é denominada de geologia isotópica ou geoquímica isotópica. O desenvolvimento do saber sobre a geoquímica isotópica apresenta evolução muito rápida, incrementando o conhecimento geológico a cada ano que passa, sendo co-responsável, entre outras disciplinas, pela revolução na geologia representada pela teoria da tectônica de placas.

Este veloz desenvolvimento da aplicação dos isótopos radiogênicos como traçadores de processos petrogenéticos decorre da impossibilidade dos pesquisadores amostrarem diretamente o interior da Terra, o que pode ser realizado apenas indiretamente pelos métodos geofísicos. Os resultados dos estudos isotópicos têm permitido importantes avanços do conhecimento sobre a natureza da crosta continental e do manto o que, agora combinado com os conhecimentos das suas propriedades físicas destes domínios (fornecido pela geofísica), permite a unificação de um modelo químico-físico do interior da Terra.

A compreensão detalhada dos sistemas ígneos e a importância destes sistemas na evolução do manto e da crosta terrestre tem sido alavancada pela aplicação dos isótopos radiogênicos de longa vida como o Rb-Sr, Sm-Nd e Re-Os. A meia vida destes pares de decaimento varia entre 40 e 100 Ga, permitindo que estes sistemas sejam adequados a resolução de problemas cosmocronológicos e geocronológicos, respectivamente aplicados a meteoritos e rochas terrestres. Juntamente com o U-Pb, os demais decaimentos formam a base das informações sobre o período inicial do sistema solar e do Precambriano como também é o substrato para a divisão do tempo geológico no Paleozóico, com idades variando desde o Arqueano até o Paleozóico.

As razões isotópicas em um magma são características de uma ou mais fontes a partir do qual o magma foi formado e as razões permanecem constantes durante o processo de cristalização fracionada. Esta constância nas razões isotópicas, relativas a um mesmo elemento, ocorre por que a diferença de massa entre qualquer par de isótopos radiogênicos utilizados em estudos geoquímicos (com exceção do He, segundo Ozima e Podosek, 1983) é tão pequena a ponto de não ser fracionada por qualquer processo magmático (Figura 1). Conseqüentemente o processo de fusão parcial de um protólito ou como a cristalização fracionada de um magma tenderá a ter a mesma assinatura isotópica da sua fonte.

Figura 1. Os estudos petrogenéticos a partir de isótopos radiogênicos têm como premissa a homogeneidade dos magmas.

Esta premissa de conservação de razões isotópicas entre magma e sua fonte, leva a duas importantes conseqüências nos estudos de geoquímica isotópica. Primeiramente, fontes distintas podem ser reconhecidas por suas específicas assinaturas isotópicas e, em segundo, processos de mistura de magmas podem ser identificados quando suas fontes têm assinaturas isotópicas distintas e conhecidas. Desta forma, um dos principais objetivos da geoquímica isotópica é identificar as assinaturas isotópicas dos diferentes reservatórios na crosta e no manto através da aplicação do maior número de métodos geocronológicos possíveis.

Uma complexa questão a ser respondida é como os reservatórios adquirem a sua própria identidade, assunto estudado pela geodinâmica da crosta e do manto. Quando se está estudando processos de mistura e de contaminação de magmas, parte-se do pressuposto que os isótopos radiogênicos podem ser utilizados para a identificação de componentes oriundos de diferentes fontes que contribuíram para a formação de uma suíte magmática. O período de tempo desse processo de mistura é curto quando comparada ao tempo da maioria dos processos geológicos. Um segundo importante pressuposto na caracterização isotópica de magmas tem a ver com os modelos de evolução dos ambientes tectônicos onde as rochas magmáticas são originadas. Neste sentido, a geoquímica isotópica tem sido uma importante ferramenta para a caracterização dos diversos ambientes geológicos incluindo a compreensão e desenvolvimento do modelo da tectônica de placas no planeta Terra.

O uso de isótopos de Sr em petrogênese

A composição isotópica de Sr não fornece somente a útil indicação da idade de rochas e minerais, mas também contém informações sobre a origem das rochas ígneas e sobre os processos geológicos que afetaram suas composições químicas. Nesse sentido, o parâmetro petrogenético 87Sr/86Sr inicial fornece informações sobre o magma a partir do qual as rochas cristalizaram (Faure e Powell, 1972; Allègre et al., 1975; Chapell e White, 1974). O seu valor depende da história prévia do Sr e reflete particularmente as razões Rb/Sr dos sistemas onde o Sr residiu. Em geral, não há maneira de saber em quantos sistemas o Sr residiu e quais razões Rb/Sr havia em cada um destes sistemas, ou por quanto tempo o Sr residiu em cada sistema (Armstrong, 1968). Pode-se somente assumir histórias com um único estágio para o Sr antes de ser incorporado em um magma particular.

A principal contribuição do método Rb-Sr no que tange à petrogênese é a possibilidade de se distinguir, através do parâmetro petrogenético 87Sr/86Sr inicial, se um magma teve a sua origem exclusivamente no manto superior ou se originou, exclusivamente ou em parte, no interior da crosta continental (Leeman e Manton, 1971). Desta forma pode–se utilizar os valores de 87Sr/86Sr inicial como traçador para identificação de fontes de magmas, uma vez que as rochas do manto superior são compostas originalmente altas concentrações e Sr e baixas de Rb (em relação à crosta terrestre), além de silicatos de Fe e Mg. Por sua vez, as rochas da crosta continental são enriquecidas em Rb e empobrescidas em Sr, além de conterem mais sílica, Al e em metais alcalinos do que o manto.

A composição isotópica de Sr do manto nos dias atuais pode ser investigada pela análise das rochas vulcânicas das cadeias meso-oceânicas. Uma pergunta de difícil resposta é sobre a composição original deste manto, isto é, a composição isotópica de Sr na fase inicial de formação da Terra, há cerca de 4,55 Ga. Esta questão é difícil uma vez que mesmo no manto existe e existiu Rb suficiente para decair para Sr e modificar a composição isotópica no decorrer do tempo geológico. Para resolver esta questão podemos apelar para os meteoritos, que podem ser interpretados como corpos celestes com composição equivalente aos corpos de, por aglutinação, deram origem ao planeta Terra. A análise de meteoritos com pouco ou nemhum Rb fornecem valores de 87Sr/86Sr inicial ao redor de 0,699,. Este valor é confirmado pelo diagrama isocrônico (Figura 2) formado por pontos a partir da análise de diversos meteoritos, cujo ponto de intersecção da isócrona com o eixo Y fornece também um valor muito próximo de 0,699.

Figura 2. Diagrama isocrônico Rb-Sr com amostras de achondritos. O valor da razão inicial (JUSI=Juvinas e Sioux County) é de 0,69899. O valor obtido para o BABI (Basaltic Achondritic Best Initial) é de 0,69899. Segundo Papanastassiou e Wassemburg (1969).

Uma vez que as rochas da crosta continental são enriquecidas em Rb, conseqüentemente apresentam altas razões Rb/Sr. Assim sendo, o Sr que reside em rochas da crosta continental com o tempo (Figura 3) se tornam mais enriquecido em 87Sr radiogênico comparado com Sr que reside no manto superior (Faure e Hurley, 1963). Desta forma é razoável postular (Engel et al., 1965) que as razões 87Sr/86Sr em rochas graníticas formadas na crosta continental são significativamente maiores do que as razões 87Sr/86Sr das rochas do manto superior.

Figura 3. Diagrama de evolução isotópica de Sr na Tera no decorrer do tempo geológico.

Figura 4. A composição isotópica de Sr no início da Terra é fornecida pelos meteoritos chondríticos (BABI).

Isótopos de Sr em Rochas vulcânicas

Como foi dito, a composição isotópica do Sr do manto superior pode ser medida diretamente pela análise de rochas basálticas de cadeias meso-oceânicas (Hart et al., 1970; Petterman e Hedge, 1971) ou em diques de basaltos continentais (Leeman, 1970). Para confirmar se a amostragem dessas rochas basálticas representam a composição isotópica de Sr do manto superior pressupõe-se que: (1) O magma foi gerado no manto superior; (2) O Sr não foi contaminado pelas rochas encaixantes ou por outras fontes; (3) O Sr do magma estava isotopicamente homogeneizado com o manto a partir do qual o magma foi gerado.

Nesse sentido, a teoria de tectônica de placas tem sido útil por fornecer informações que permitem identificar rochas vulcânicas que melhor representam as assinaturas isotópicas do manto, a atividade vulcânica no interior de bacias oceânicas (cadeias meso-oceânicas) e ao longo de suas margens (arcos de ilha vulcânica). Em adição, atividades vulcânicas são também observadas no interior de placas tectônicas como manifestação de plumas.

Os menores valores de razão 87Sr/86Sr (0,7028) atuais (Figura 5) ocorrem em basaltos toleíticos originados nas cadeias meso-oceânicas (O’Nions e Pankhurst, 1974; Subbarao e Hedge, 1973). Os valores de razão 87Sr/86Sr em ilhas oceânicas (0,70386) (Hart, 1969; Whitford, 1975), arcos de ilha (0,70437) (Yanagi, 1975) e arcos continentais (0,70577) (Harmon e Barreiro, 1984) são sucessivamente mais altos. Este aumento nos valores da razão 87Sr/86Sr pode resultar da contaminação dos magmas com 87Sr radiogênico derivado de crosta siálicas mais antigas ou de seus derivados. Esta hipótese de contaminação é mais provável no caso de rochas vulcânicas continentais cujos valores de razão 87Sr/86Sr chegam até 0,710. A contaminação também pode ajudar a explicar valores também altos da razão 87Sr/86Sr em rochas vulcânicas em arcos de ilha e ilhas oceânicas onde o magma pode ter recebido contribuições de sedimentos terrígenos derivados de continentes próximos ou pela interação com a água do mar.

A composição isotópica do Sr em rochas vulcânicas e plutônicas associadas a zonas de subducção são de particular interesse petrogenético. A distinção entre subducção de crosta oceânica sob crosta oceânica, que originam os arcos de ilha, e a subducção de crosta oceânica sob crosta continental, que origina os arcos magmáticos continentais, pode ser feita com o auxílio dos isótopos de Sr. Neste sentido, os arcos magmáticos continentais apresentam maior contaminação de crosta continental mais velha, enquanto os arcos de ilha apresentam menos contaminação e valores de razão 87Sr/86Sr mais próximos dos valores do manto. Sobre as zonas de subducção e suas assinaturas isotópicas de Sr pode-se ainda dizer que a profundidade da zona de Benioff, onde o magma é gerado, também produz interferência na assinatura isotópica de Sr de seus produtos vulcânicos, de forma que quanto mais profundo o magma é gerado, maior espessura de crosta ele atravessa e conseqüentemente maiores valores de razão 87Sr/86Sr. Em contrapartida, quanto menor a profundidade de geração do magma, menor a espessura de crosta atravessada, produzindo rochas vulcânicas com valores menores da razão87Sr/86Sr.

Figura 5. Diagramas de freqüência da razão inicial 87Sr/86Sr para os basaltos de Fundo Oceânico, de Ilhas Oceânicas, de Arcos de Ilhas e Continetais.

Isótopos de Sr em Rochas plutônicas

A maioria das rochas plutônicas apresenta como constituintes básicos o quartzo, feldspato e minerais ferromagnesianos como hornblenda e biotita. Estas rochas podem ser produto de diversos processos geológicos ocorridos em vários ambientes tectônicos. Como por exemplo, pode-se ter rochas graníticas geradas a partir de magmas basálticos ou mantoderivados (Figura 6) que se solidificam por processos de cristalização fracionada (Pidgeon e Hopgood, 1975) ou ainda rochas graníticas geradas a partir da fusão parcial de rochas crustais de diferentes composições (Moorbath et al, 1975). Neste contexto os isótopos de Sr podem auxiliar para distinguir produtos cuja composição química e mineralógica resulta de fontes distintas e que tiveral suas composições isotópicas mudadas (Figura 7) o decorrer do tempo geológico.

Figura 6. Diagrama de evolução isotópica de Sr para rochas da crosta continental. A = rochas antigas mantoderivadas. B = rochas mantoderivadas. C = rochas de derivação crustal.

Figura 7. Diagrama de evolução isotópica de Sr para os reservatórios do Manto, Crosta Inferior e Crosta Superior.

No caso de um granito ter sido gerado por cristalização fracionada a partir de um magma basáltico, sua razão 87Sr/86Sr deve ser baixa, como a maioria dos basaltos. Da mesma forma rochas graníticas geradas por fracionamento magmático de magmas originados em zona de subducção devem apresentar baixa razão 87Sr/86Sr uma vez que esses magmas podem ter origem mantélica além de contribuições de rochas basálticas provenientes da crosta oceânica em subducção (Taylor, 1980). Se, por outro lado, um granito se originou de material siálico mais antigo, sua razão 87Sr/86Sr deve ser relativamente mais alta. Desta forma, as razões 87Sr/86Sr dependem da proporção entre material siálico mais antigo e material juvenil (isto é, derivado do manto) que participou na formação do magma (Figura 8).

Figura 8. Diagrama mostrando mistura de magmas com valores modelados segundo a variação isotópica de 87Sr/86Sr versus Sr e 87Sr/86Sr versus 1/Sr a partir de dois reservatórios distintos (A) e (B).

Isótopos de Sr em rochas alcalinas e carbonatitos

Os estudos de isótopos de Sr em rochas carbonatíticas tem colaborado com evidências que demonstram que estas rochas magmáticas se originam a grande profundidade, no manto superior ou mais provavelmente no manto inferior. As razões 87Sr/86Sr de rochas carbonatíticas apresentam baixos valores (0,704) e são similares aos valores observados em rochas basálticas originadas em cadeias meso-oceânicas (DePaolo e Wassemburg, 1976; Dosso e Murthy, 1980).

A petrogênese de rochas alcalinas ainda permanece um problema em aberto. Os isótopos de Sr mostram que muitas dessas rochas podem ser formadas tanto por cristalização fracionada de magmas basálticos quanto de magmas graníticos. Informações ainda obtidas a partir de isótopos de Sr sugerem que rochas potássicas podem ser geradas por um processo misto (crustal e mantélico), porém os dados podem ser explicados igualmente bem pela hipótese de fusão parcial de mantos primitivos. Os valores de 87Sr/86Sr observados estão entre 0,7034 e 0,7081 segundo Faure e Powell (1972).

Isótopos de Sr em rochas ultramáficas

Uma revisão dos dados isotópicos de Sr permite sugerir duas possíveis fontes para as rochas máficas e ultramáficas. O primeiro grupo de rochas apresentam alto conteúdo em Sr e é exemplificado por intrusões estratiformes, anortositos e pequenos sills. Todas essas rochas apresentam usualmente baixos valores de razão 87Sr/86Sr idênticas aos basaltos de cadeias meso-oceânicas. Esses resultados são consistentes com a hipótese de que os magmas parentais das tais rochas são derivados do manto (Faure et al, 1963; Van Schmus et al., 1965).

Um segundo grupo de rochas com baixos teores de Sr pode ser exemplificado por peridotitos do tipo Alpino e nódulos peridotíticos em basaltos. Esse grupo também apresenta baixos valores de razão 87Sr/86Sr porém com valores superiores a 0,710 com exemplos que atingem valores de até 0,729. A explicação mais simples é que estas rochas com baixo teor de Sr foram contaminadas com Sr radiogênico, incluindo também Rb, das rochas encaixantes (Allègre et al., 1981a e b).

As análises de isótopos de Sr nas rochas máficas e ultramáficas fornecem úteis informações petrogenéticas mostrando evidências que indicam a existência de Sr radiogênico primário (mantélico) ou originado a partir de rochas externas ao magma original. Em tais casos os isótopos de Sr constituem uma importante ferramenta de estudo através da análise das composições químicas e isotópicas tanto utilizando rocha total quanto fases minerais individuais separadas da matriz.

O uso de isótopos de Nd em petrogênese

O Sm e Nd são elementos litófilos fortemente enriquecidos na crosta continental e na crosta oceânica por fatores entre 10 e 100 vezes em relação aos reservatórios mantélicos (Herrmann et al., 1970). A utilização dos catorze elementos terras raras são importantes no estudo de processos ígneos responsáveis por estas variações composicionais nos diversos reservatórios terrestres. O Sm e o Nd são elementos terras raras (ETR) com valência +3 e raios iônicos similares, e conseqüentemente apresentam comportamentos geoquímicos equivalentes (Wassemburg et al., 1981). Esses elementos são incompatíveis durante a cristalização magmática sendo apenas aceitos nos sítios cristalográficos nas fases residuais. Como resultado, a determinação das composições isotópicas de Sm e Nd tem contribuído de forma significativa na compreensão da formação de rochas vulcânicas em cadeias meso-oceânicas, arcos de ilha, etc. Em adição, as composições isotópicas de Sm e Nd permitem novas postulações sobre a origem de granitos e da evolução da crosta continental a partir do manto.

O Sm-Nd apresentam vantagens em relação ao Rb-Sr, U-Pb e Re-Os no estudo do manto em função do comportamento geoquímico dos elementos terras raras e sua resistência a alteração intempérica ou hidrotermal. A comparação entre as razões Sm-Nd com as razões Rb-Sr e Re-Os, demonstra que as variações entre Sm e Nd em chondritos, manto e crosta são muito pequenas.

O Reservatório Mantélico

O manto superior apresenta significantes variações em termos de concentração de Sm e Nd, de forma que e razão Sm/Nd depende dos repetidos eventos de fusão parcial do manto através do tempo geológico que resultam na formação de crosta (DePaolo, 1981). Análises de amostras mantélicas (como o lherzorlito) usualmente apresentam valores de Sm/Nd equivalentes aos chondritos, (com abundâncias variando entre 0,2 a 3 vezes) e valores de eNd positivos. Os exemplos estudados nestas rochas com Sm/Nd > 1 são equivalentes aos valores encontrados nos chondritos, entretanto os exemplos com Sm/Nd < 1 são interpretados como originados em fontes mantélicas enriquecidas por injeções de material da crosta oceânica ou fontes influenciadas por fluídos metassomáticos.

Figura 9. Diagrama de evolução isotópica de Nd. As rochas derivadas da fusão parcial do manto geram reservatórios crustais de baixas razões 143Nd/144Nd. Em contrapartida, os resíduos desta fusão parcial do manto geram um reservatório com altas razões 143Nd/144Nd.

Xenólitos ultramáficos compostos por granada-peridotitos, espinélio-peridotitos e piroxenitos encontrados em erupções basálticas ou em kimberlitos apresentam grande variação na abundância de Sm e Nd e na razão Sm/Nd. Estas amostras apresentam Sm/Nd < 1 e altas concentrações de Sm e Nd entre 0,6 até 7 vezes as concentrações dos chondritos. Muitos desses xenólitos são interpretados como formados na litosfera continental empobrecida devido a fusões parciais ocorridas durante a formação de líquidos basálticos. Por outro lado estes xenólitos podem apresentar esta razão Sm/Nd baixa como resultado de processos metassomáticos ocorridos anteriormente a formação do magma ou durante a ascensão deste xenólitos até a crosta (Carter et al., 1978).

Entretanto, estas variações composicionais entre Sm e Nd no manto podem ser entendidas como o resultado geodinâmico de um sistema aberto. Nesta hipótese, o manto provavelmente teria passado por múltiplos estágios de empobrecimentos ou enriquecimentos de elementos terras raras o que foi acompanhado, respectivamente, por processos de fusão ou mistura através do tempo geológico. Seguindo este raciocínio, o processo de convecção e história prolongada de alta temperatura até mesmo para porções litosféricas, pode render ao manto uma característica de sistema aberto na escala de amostras individuais ou mesmo de afloramento.

A razão Sm/Nd em rochas basálticas oceânicas (MORB) ou continentais (OIB) tende a copiar as razões de suas fontes. Por outro lado, o comportamento desses elementos no manto é caracterizado pela incompatibilidade aos resíduos peridotíticos durante as condições de fusão parcial para geração de MORD e OIB. Basaltos alcalinos de ilhas oceânicas apresentam consistente razão Sm/Nd menor (0,22) do que MORB (0,32), independente da extensão do processo de fusão parcial, o que é interpretado como resultado do enriquecimento do Nd em relação ao Sm comparado com suas fontes. Entre 5 e 15% de fusão parcial de uma rocha mantélica pode produzir magmas com a mesma variação da razão Sm/Nd encontrada em xenólitos e lherzorlitos. Apesar destas diferenças serem extremamente úteis na definição de ferramentas para o estudo de processos de convecção do manto, eles não são úteis para estudos geocronológicos uma vez que a mistura entre fontes de composições isotópicas distintas não permite a utilização dos produtos desse processo (as rochas) na construção de isócronas por não serem co-magmáticos, apesar de que podem apresentar a mesma razão isotópica inicial.

O reservatório crustal

Em comparação com o manto, as rochas da crosta siálica apresentam maior variação nas concentrações de Sm e Nd, porém apresentam valores de razão Sm/Nd mais uniformes e valores deeNd negativos (McCulloch e Wassemburg, 1978; Allègre e Othman, 1980) Durante a fusão parcial da crosta continental, tanto Sm como Nd são enriquecidos nos magmas principalmente por serem excluídos das duas fases residuais mais abundantes na crosta: feldspato e quartzo. As diferenças entre os comportamentos de Sm e Nd são dominadas pelas outras fases residuais com biotita, anfibólio, granada e piroxênio, além de minerais acessórios como alanita, monazita, zircão, titanita e apatita. Os efeitos desses minerais na razão Sm/Nd e nas suas concentrações individuais em fundidos crustais indicam a diminuição da razão Sm/Nd e o enriquecimento desses elementos (Jacobsen e Wassemburg, 1979).

Contrariando esta regra, são observadas exemplos de rochas com razões Sm/Nd maiores e abundância de ETR menores durante a formação de granitóides em casos reportados na literatura. Entre estes exemplos, pode-se citar tonalitos derivados da fusão parcial de basaltos com razão alta Sm/Nd, como também de concentrações de Sm e Nd menores do que os seus protólitos. Pode-se citar também a existência de granodioritos derivados da fusão de monzodioritos com razão Sm-Nd e abundância de Sm e Nd similares aos encontrados nas suas rochas parentais. Outros exemplos anômalos são encontrados em granitóides pegmatíticos e topázio-riolitos formados pela fusão de crosta félsica. Infelizmente, as idades modelo Sm-Nd nesses casos não apresentam significado geológico uma vez que o fracionamento entre Sm e Nd resulta em idades modelos futuras ou mais velhas do que a terra.

Na maioria dos casos reportados, as baixas razões Sm/Nd observadas em granitóides formados por processos de fusão crustal permitem uma precisa intersecção de suas curvas de crescimento isotópicos de Nd com a curva de crescimento isotópico do manto empobrecido. Esta feição do método Sm-Nd em granitóides permite a ampla utilização das idades modelo TDM para estimativa de idades de formação de crosta ou de sua extração do manto empobrecido. Nesta situação o eNd atual é negativo e a idade TCHUR é centenas de Ma menor do que a idade TDM. Uma vez que o manto superior empobrecido é tido como a principal fonte para a formação de crosta, as idades TDM tendem a se aproximar das idades de cristalização em materiais juvenis.

Figura 10. Os valores do parâmetro petrogenético eNd nos diversos reservatórios crustais e mantélicos.

1) Crosta oceânica: a composição isotópica de Nd dos basaltos tipo MORB (Meso Ocean Ridge Basalts) indicam que eles se originam a partir de fontes que tem razão Sm/Nd maiores do que o reservatório condrítico. Esta composição isotópica resulta em valores de eNd ao redor de +10. Como exceção pode se citar as ilhas Kerguelen no oceano Índico cujas rochas basálticas indicam fontes mantélicas com baixa razão 143Nd/144Nd, interpretados em termos de processos de fracionamento que resultam em altas razões Sm/Nd. Descartando os casos excepcionais, as rochas basálticas toleíticas características da crosta oceânica apresentam valores e Nd entre +8 e +10. Em adição, complexos ofiolíticos apresentam valores de eNd ao redor de +8.

2) Arcos magmáticos oceânicos: Os arcos magmáticos construídos inteiramente a partir da colisão de crostas oceânicas apresentam pequena variação de eNd, com valores entre +6,5 e +10. Esses valores são equivalentes aos dos encontrados nos ofiolitos e sobrepõe com os menores valores observados nos basaltos toleíticos de fundo oceânico. Existem duas hipóteses para explicar o fato de que a média dos valores de e Nd nos arcos magmáticos oceânicos são 2 unidades menores do que os valores médios dos MORB: (a) a fonte mantélica dos arcos magmáticos são diferentes das fontes dos MORBs ou (b) os menores valores de eNd resultam da mistura de sedimentos subductados de baixos valores de eNd na fonte das rochas dos arcos magmáticos oceânicos.

3) Arcos magmáticos continentais: Os magmas produzidos em ambiente de colisão envolvendo crosta continental podem apresentar mistura de (a) crosta oceânica alterada hidrotermalmente, (b) sedimentos terrígenos da crosta oceânica, (c) o manto abaixo da zona de subducção e (d) rochas siálicas da crosta continental. Estas variações de fontes resultam em valores variados de eNd fato ilustrado por diversos exemplos de arcos magmáticos atuais ao longo de zonas de subducção. Em síntese, os valores de eNd são preponderantemente positivos quando há uma maior proporção de contribuição mantélica nas rochas geradas em arcos magmáticos continentais.

4) Basaltos continentais: Os valores de eNd dos basaltos continentais são significativamente menores do que os observados nos basaltos de fundo oceânico. Estes dados isotópicos indicam a existência de uma fonte mantélica de alta razão Sm/Nd para os basaltos continentais (DePaolo e Wassemburg, 1979). A composição isotópica original do manto sob os continentes é de difícil definição uma vez que a intrusão de magma nas crostas continentais pode resultar na sua contaminação pela crosta mais antiga. De qualquer forma, os valores de eNd   dos basaltos continentais variam entre +5 (equivalentes aos MORBs) a –5 (basaltos) possivelmente contaminados pela crosta mais antiga.

O uso de isótopos de Pb em petrogênese

Os isótopos de Pb são mais complexos em relação aos outros sistemas isotópicos decorrente da existência de 3 diferentes decaimentos e também por que a evolução de isótopos de Pb não definem tendências lineares. Em geral U e Pb são relativamente móveis em processos crustais, particularmente em situações magmáticas onde Th é altamente insolúvel. Tanto U quanto Pb são elementos incompatíveis em silicatos apesar de que o U ser aceito com mais facilidade do que o Pb.

Figura 11. Evolução dos reservatórios terrestres em relação a razão U/Pb (C=crosta; DM=depleted mantle; BE=bulk Earth).

Figura 12. Reservatórios terrestres definidos a partir dos isótopos de Pb segundo Zartman e Doe (1979).

Os dois isótopos de Pb produzidos por decaimento do U (206Pb e 207Pb) mostram evoluções isotópicas contrastantes como conseqüência de suas diferentes taxas de decaimento radioativo. Desde a formação da Terra o 235U teve uma rápida diminuição de sua abundância em relação ao 238U que decaía mais lentamente, o que provocou um rápido aumento de 207Pb em relação ao 206Pb, os isótopos-filhos respectivos. Como resultado destes diferentes padrões de decaimentos entre o 238U e 235U, as abundâncias do 207Pb e do 206Pb são indicadores extremamente sensíveis em termos de idades de fontes. Atualmente o 235U está em grande parte extinto (cerca de 1/12 do valor inicial), de forma que na história recente da Terra, as maiores abundâncias do 238U e conseqüentemente as abundâncias de 206Pb, tornam mais viável a aplicação deste par de isótopos em rochas do Fanerozóico em relação aos pares 235U-207Pb e 232Th-208Pb.

A diferença da evolução isotópica entre os isótopos de Pb no decorrer da história do planeta permitiu a formação de diversos reservatórios isotópicos. O reservatório crustal é o melhor amostrado pelos estudos de composição isotópica. Um modelo baseado no poder discriminatórios dos isótopos de Pb foi desenvolvido por Doe & Zartman (1979), que demonstraram que a composição isotópica de Pb varia dependendo do ambiente tectônico. Eles demonstraram que 3 reservatórios podem ser caracterizados por suas concentrações de U, Th e Pb: a crosta continental superior, crosta continental inferior e manto superior. Esses elementos são concentrados na crosta continental superior com enriquecimento de U e Th em relação ao Pb resultando em um reservatório enriquecido em Pb radiogênico. A crosta continental inferior é empobrecida em Th e U e é enriquecida em Pb não radiogênico. O manto tem concentrações menores de U, Th e Pb do que a crosta continental, mas tem razões U/Pb e Th/Pb com valores intermediários entre os dois reservatórios crustais (Crosta Superior e Inferior) de forma a ter Pb de caráter intermediário. A mistura do Pb desses 3 reservatórios pode ocorrer em ambientes orogenéticos, produzindo um quarto reservatório caracterizado por uma composição isotópica de Pb mista.

O uso de isótopos de Os em petrogênese

A caracterização da composição isotópica do Re e do Os em sistemas ígneos permite a identificação de reservatórios crustais e mantélicos. Rochas basálticas, molibdenitas e alguns granitos são os principais candidatos a fornecerem composições isotópicas de Os radiogênico. Por outro lado, a composição isotópica de Os extremamente não radiogênico de xenólitos peridotitos oriundos do manto litosférico permite o seu uso para o cálculo de idade Re-Os modelo TCHUR.

Durante a fusão do manto para a formação de magmas toleiíticos e komatiíticos, o Re e o Os apresentam comportamentos diferentes. O Os apresenta aumento no coeficiente de distribuição (CD) com a diminuição da fusão parcial, produzindo komatiítos e toleiítos com concentrações de Os de 1-2 ppb e 100 ppt (respectivamente). Isto pode ser explicado pela influência de sulfetos e fases metálicas que controlam a distribuição dos Elementos do Grupo da Platina (EGP), uma vez que o Re permanece incompatível no decorrer do processo de fusão (Anders e Ebihara, 1982).

Em sistemas magmáticos, a concentração de Os na rocha está relacionada fortemente com o número de Mg (Mg # = Mg/ (Mg+++ )), enquanto o Re apresenta comportamento incompatível (Figura 13). A fusão de rochas máficas e ultramáficas a partir do manto provoca um extremo fracionamento entre Re e Os e conseqüentemente o aumento da razão Re/Os (Figura VIII 14), o que resulta no rápido crescimento do 187Os radiogênico na crosta (Allègre e Luck, 1980). Este processo de fracionamento provoca variações da razão Re/Os em produtos de processos vulcânicos (ignimbritos e piroclásticas) e rochas intrusivas permitindo que o sistema Re-Os possa ser usado diretamente para a determinação de idades absolutas de rochas máficas e ultramáficas. Este comportamento entre magmas máficos e ultramáficos e seus resíduos são uma feição particular do sistema Re-Os para a geocronologia, o que o distingue dos outros sistemas isotópicos como Rb-Sr e Sm-Nd

Em rochas crustais siálicas, tais como granitos, o Re não é tão enriquecido quanto previsto por seu coeficiente de distribuição no manto, apresentando concentrações que variam entre 0,04 e 0,34 ppb. Explicar o processo petrogenético pelo qual as rochas resultam em baixas concentrações é um importante problema na compreensão do sistema Re-Os. Encontrar um mineral magmático com baixa razão Re/Os seria um importante pré-requisito para obter isócronas Re-Os precisas e razões iniciais de 186Os/187Os em sistemas graníticos. Devido a essa dificuldade de se obter idades isocrônicas para rochas graníticas, as idades modelo TCHUR em rochas crustais podem ser de grande utilidade. A alta razão 187Re/186Os na crosta contrasta com o manto empobrecido que apresenta Os radiogênico em menor proporção, facilitando a utilização de idades modelo TCHUR em rochas crustais.

Figura 13 Diagrama mostrando crescentes porcentagem de fusão mantélica e as variações dos valores de %MgO e %FeO (correlacionáveis a concentração de Os) durante a fusão parcial do manto em várias proporções (10%, 20%, 30%, 40% e 50%).

Figura 14. Diagrama de evolução isotópica de Os a partir de reservatório mantélico. Os reservatórios manto-derivados apresentam valores de 187Os/186Os maiores do que os restitos resultantes da fusão parcial.

Outro aspecto particular do sistema Re-Os é a sua importância na aplicação dos isótopos de Os como traçador. O efetivo fracionamento de Re/Os na formação da crosta leva a um rápido aumento de Os radiogênico em rochas tais como MORB. Como conseqüência, a composição isotópica de Os é um traçador sensível para detectar a participação de rochas basálticas fundidas em zonas de subducção. Comparado com o fracionamento entre Re e Os, o fracionamento entre Rb e Sr ou Sm e Nd é menor durante a fusão de um peridotito. Um outro aspecto importante do sistema isotópico Re-Os é a alta abundância de Os no manto relativo a crosta, resultado da compatibilidade deste elemento em rochas de composição peridotítica. Suas concentrações do manto podem ser entre 10 e 100 vezes maiores do que as concentrações da crosta. Tal concentração permite sugerir que fragmentos mantélicos carregados até a superfície por vulcanismo explosivo é relativamente irrelevante para a contaminação da crosta.

Os isótopos de Sr, Nd, Os e Pb e os reservatórios terrestres

A aplicação de vários sistemas isotópicos a estudos petrogenéticos passou a ser uma ferramenta imprescindível para a identificação e caracterização de fontes e processos geradores de magma. A possibilidade de uso conjunto dos isótopos radiogênicos de meia-vida longa abriu novas frentes para definição de modelos sobre reservatórios crustais e mantélicos e como esses reservatórios interagem e como eles alcançaram a composição isotópica atual. Um dos maiores sucessos da moderna geoquímica isotópica é a compatibilização dos modelos propostos para estes reservatórios com os processos que governam a tectônica de placas e a tentativa de quantificar a proporção de mistura entre duas possíveis fontes (Figura 15).

Os modelos baseados em isótopos de Nd, Sr, Pb e Os enfatizam os reservatórios crustais, o que tem permitido um rápido avanço na compreensão da evolução da crosta continental. O avanço das técnicas laboratoriais dos sistemas Sm-Nd e Re-Os, bem como novas proposições interpretativas destes métodos, tem permitido a aplicação destas ferramentas como verdadeiras sondas no interior da Terra. Estas informações aliadas com os modelos geofísicos, permitirão novas interpretações sobre a composição e a evolução da crosta e do manto.

Figura VII.15. Modelamento de mistura de rochas originadas em dois reservatórios de diferentes composições isotópicas Os versus Sr, Os versus Nd e Os versus Pb.

Os diferentes isótopos radiogênicos utilizados em geoquímica isotópica variam enormemente em suas propriedades químicas de forma que diferentes sistemas isotópicos apresentam distintas sensibilidades em processos petrológicos particulares. A sensibilidade do método varia em função dos isótopos radiativos e radiogênicos que podem sob certas circunstâncias apresentar diferentes comportamentos de forma a fracionarem entre si. A ordem de incompatibilidade dos elementos de interesse é Rb > Th > U > Pb > Nd > Sr > Sm resultando em razões nos reservátórios Manto, Crosta Superior r Crosta Inferior (Figura 16).

Figura 16. Tabela comparativa entre os isótopos de Sr, Nd, Pb e Os em diversos reservatórios terrestres.

Esta ordem indica a seqüência de elementos fracionados para a crosta relativo ao manto empobrecido. Por exemplo, Rb é o elemento mais concentrado na crosta relativo ao manto empobrecido enquanto Sm e Sr são os menos concentrados. Alternativamente, o par de decaimento pode se comportar coerentemente e não ser fracionado. Um bom exemplo é o contrastante comportamento entre o Sm-Nd e Rb-Sr, onde os primeiros compartilham características físicas e químicas muito similares, enquanto o Rb-Sr são elementos fortemente fracionados entre si.

Os reservatórios mantélicos

As rochas magmáticas jovens geradas em cadeias meso-oceânicas atuais registram diretamente a composição isotópica de suas fontes mantélicas (Figura 17). Isto ocorre porque não há tempo suficiente para o isótopo radioativo (147Sm, 235U, 238U, 232Th, 87Rb, 187Re) presente na rocha decair e produzir isótopos radiogênicos de forma a adicioná-los aos originalmente herdados da fonte. Os possíveis reservatórios isotópicos do manto podem ainda apresentar misturas entre si, porem 5 fontes foram discriminadas:

Figura 17. Reservatórios Manto

Manto empobrecido

Este reservatório é caracterizado por alta razão 143Nd/144Nd, baixo 87Sr/86Sr e baixo 206Pb/204Pb, e é o componente dominante na fonte da maioria dos basaltos toleíticos de fundo oceânico.

HINU

Este reservatório mantélico apresenta altas razões 206Pb/204Pb e 208Pb/204Pb incluindo baixa razão 87Sr/86Sr (ao redor de 0,7030) e valores intermediários de 143Nd/144Nd. Estas assinaturas isotópicas indicam um reservatório mantélico enriquecido em U e Th (em relação ao Pb) sem o aumento associado na razão Rb/Sr (Figura 18). Este enriquecimento é interpretado como tendo ocorrido entre 1,5 Ga e 2,0 Ga possivelmente a partir da mistura de uma crosta oceânica (contaminado com água do mar), ou associado a uma intensa perda de Pb e Rb por metassomatismo.

Manto Enriquecido

Este reservatório mantélico apresenta variável razão 87Sr/86Sr, baixo 143Nd/144Nd e altas razões 207Pb/204Pb e 208Pb/204Pb. O reservatório manto empobrecido pode ainda ser subdivido em tipo-1 (EMI) com baixo 87Sr/86Sr e tipo-2 (EMII) com alta razão 87Sr/86Sr. Existem vários modelos para explicar a origem do manto enriquecido. Em termos gerais o enriquecimento parece estar relacionado a subducção, onde o material crustal é injetado no interior do manto. Um modelo alternativo é baseado na similaridade entre manto enriquecido e litosfera subcontinental, o que sugere a mistura de ambos para formação do reservatório mantélico enriquecido (Hawkesworth et al., 1979).

Figura 18. Reservatórios mantélicos definidos pelos isótopos de Nd e Pb.

PREMA

A grande freqüência de basaltos de ilhas oceânicas (Figura 18 e Figura 19) e continentais com razões 143Nd/144Nd = 0,5130 e razões 87Sr/86Sr = 0,7033 sugere a existência de um reservatório mantélico com tal assinatura isotópica. Sua denominação deriva do termo “PREvalente MAntle resevoir”. Em adição, sua composição isotópica de Pb indica razões 206Pb/204Pb entre 18,2 e 18,5.

Figura 19. Diagrama em 3 dimensões dos isótopos de Pb, Sr e Nd. para a caracterização isotópica de rochas coletadas em Ilhas Oceânicas Basálticas (IOB) de vários locais no mundo. Adaptado de Zindler et al. (1982) e Dickin (1991).

BSE = Bulk Silicate Earth

Existem algumas evidências de existência de um reservatório mantélico cuja composição é equivalente a parte silicática da Terra, isto é, o reservatório chondrítico subtraído do núcleo. Esta composição é equivalente ao do manto primitivo homogêneo formado no início do planeta durante a formação do núcleo e anteriormente a formação dos continentes. Alguns basaltos oceânicos apresentam composição isotópica próxima desse reservatório BSE. Apesar de não haver dados geoquímicos que permitam afirmar que este reservatório ainda sobreviva.

Os reservatórios crustais

A composição isotópica das rochas que constituem a crosta continental é extremamente variada e as razões isotópicas somente podem ser comparadas se todas as amostras apresentam a mesma idade. Desta forma as diferenças composicionais são melhor consideradas quando normatizadas por um parâmetro que leve em conta a idade da amostra. Uma das principais formas de normatização é através da referência definida como a composição da terra como um único reservatório a 4,6 Ba (reservatório chodrítico). A composição analítica de amostras crutais pode ser lançada em um diagrama relativo ao tempo tendo como referência uma curva de evolução do isótopo em questão no reservatório chondrítico. No caso do método Sm-Nd, esta referência pode ser quantificada em termos de eNd . Para o método Rb-Sr é utilizada a curva de evolução da razão inicial 87Sr/86Sr e para o método Re-OS utiliza-se a linha de desenvolvimento de Os fornecido pelos dados de amostras e osmerídio de diferentes idades.

Crosta continental superior

Este reservatório é caracterizado pela alta razão Rb/Sr e conseqüentemente apresenta altas razões 87Sr/86Sr. As razões isotópicas de Nd por outro lado apresentam baixos valores comparados com o manto como conseqüência do enriquecimento ETR leves e baixas razões Sm/Nd. U e Th são enriquecidos na crosta continental superior, o que também resulta em altas razões 206Pb, 207Pb e 208Pb.

Crosta continental média

Esse reservatório compreende extensas áreas de gnaisses metamorfizados na face anfibolito, denominado de terrenos granito gnáissicos. Essas rochas apresentam baixas razões 143Nd/144Nd e razões 87Sr/86Sr menores do que na crosta superior. O U entretanto, é empobrecido acarretando razões 206Pb/204Pb e 207Pb/204Pb menores do que no manto. A concentração de Th é menor do que na crosta superior mas não tão empobrecido quanto o U.

Crosta continental inferior

Esse reservatório é caracterizado pelo metamorfismo na face granulito e é freqüentemente empobrecido em Rb. Como resultado ocorrem baixas razões 87Sr/86Sr o que não é muito diferente dos valores atuais do manto. Isto significa dizer que um granito recente derivado da crosta inferior apresenta valores de razão 87Sr/86Sr inicial semelhantes a um granito derivado do manto também de idade recente. Em adição, razões U/Pb e Th/Pb na crosta inferior são menores do que os valores atuais do manto de forma que as razões isotópicas concernentes aos isótopos 206Pb, 207Pb e 208Pb são muito baixas e podem ser utilizadas para distinguir rochas geradas a partir de reservatórios da crosta inferior e do manto.

Litosfera subcontinental

Este reservatório continental não é facilmente caracterizado como os outros domínios uma vez que apresenta variáveis composições isotópicas. Por exemplo, este reservatório pode apresentar composição isotópica de Nd e Sr heterogênea englobando domínios mantélicos com composições isotópicas similares ao EMI e EMII. Algumas variações da composição isotópica podem estar co-relacionadas com a idade da litosfera subcontinental. Este reservatório quando de idade Arqueana poderia estar sobre uma litosfera enriquecida (com baixo Rb/Sr e baixo Sm/Nd). Quando de idade Proterozóica, esse reservatório se assemelha ao manto empobrecido encontrado sob bacias oceânicas. Litosferas subcontinentais Proterozóica a Fanerozóica são caracterizadas pelo enriquecimento em Rb e em ETR leves resultando em alto Sr radiogênico e Nd não radiogênico, equivalente ao manto enriquecido EMII

O alinhamento do manto (mantle array)

A análise da composição isotópica do MORB e de rochas ígneas coletadas em ilhas oceânicas permite a definição e caracterização de diversos reservatórios mantélicos fontes destas rochas. Os resultados apresentados por Richard et al (1986) e por DePaolo & Wassburg (1986) demonstrava que as razões de 143Nd/144Nd em rochas ígneas recentes do fundo oceânico variam enormemente e que quando lançados os dados em um diagrama 143Nd/144Nd versus 87Sr/86Sr, define-se um alinhamento dos pontos analíticos (Figura 20) . A co-relação entre 143Nd/144Nd e 87Sr/86Sr indica que os basaltos oceânicos se originaram a partir de reservatórios com razão Rb/Sr baixa e razões Sm/Nd altas. As razões 143Nd/144Nd e 87Sr/86Sr para estas rochas jovens definem um alinhamento denominado de mantle array (Figura 21). Por suas idades jovens estas rochas devem representar a composição atual do manto uma vez que são rochas basálticas não contaminadas cujas idades jovens ainda não permitiu a geração de isótopos radiogênicos, apresentando as razões isotópicas iniciais originais.

Figura 20. Os dados isotópicos de Nd e Sr indicam uma tendência a partir das amostras de origem mantélica (“mantle array”).

A alteração pela água do mar é detectável por critérios mineralógicos e geoquímicos podendo ser evitado pela criteriosa escolha de amostras. Em todo caso a composição isotópica de Nd nestas rochas é alterada pela água do mar somente quando a razão água/rocha assume valores acima de 105 , uma vez que a concentração de Nd na água do mar é de apenas 2,6x10-6 ppm. Entretanto as razões 87Sr/86Sr destas rochas podem ser aumentadas de forma significativa com razões água/rocha muito menores, uma vez que a água do mar apresenta a concentração de Sr ao redor de 8 ppm. Mesmo que a contaminação por água do mar possa aumentar a razão 87Sr/86Sr nas rochas ígneas, o alinhamento do manto não pode ser atribuído a esta causa

Figura 21. Diagrama 143Nd/144Nd versus 87Sr/86Sr mostrando o alinhamento do manto (Mantle Array) onde as diferentes rochas basálticas de fundo oceânico se alinham indicando as diversos reservatórios mantélicos.

A colinearidade das razões isotópicas de Nd e Sr para rochas basálticas de fundo oceânico e de ilhas oceânicas pode ser utilizadas para definir as razões 87Rb/86Sr e 87Sr/87Sr para a Terra que são complementares aos dados do Nd. O alinhamento dos dados isotópicos obtido quando lançado no diagrama 143Nd/144Nd versus 87Sr/86Sr indica uma razão 87Sr/86Sr entre 0,7045 e 0,7055 compatível com uma razão 143Nd/144Nd igual 0,512638 para o CHUR atual. Quando somente basaltos oceânicos são utilizados para definir o alinhamento do manto, as razões 87Sr/86Sr do reservatório da Terra atuais são 0,7045 e sua razão atual 87Rb/86Sr é de aproximadamente 0,0816, levando em conta que a razão 87Sr/86Sr primordial na Terra 0,69899 (BABI) e a idade da Terra é de 4,6x109 anos. A razão 87Sr/86Sr da Terra derivada do diagrama 143Nd/144Nd versus 87Sr/86Sr pode ser utilizada, desta forma, para definir o parâmetro eSr .

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